quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Pedro Maia Gomes

Português, Doutorado em Ecomomia, Professor na Universidade Carlos III, Madrid.

Escreveu este artigo, brilhante, que tomo a liberdade de partilhar dado que foi publicado na imprensa; concluiu o que JAS e HM do Sol e Expresso, respectivamente, nunca teriam a coragem de escrever, dado ser uma abordagem "politicamente incorrecta"!


http://personal.lse.ac.uk/GOMESP/8-Press/Expresso100904.pdf
Fazer o que ainda não feito
A primeira reacção à proposta de um corte dos salários no sector público serásempre negativa. No entanto, é preciso ter coragem para a discutir sem preconceitos poisexistem razões que a sustentam.O processo de determinação dos salários na função pública é muito diferente dosector privado. Imaginemos uma fábrica onde as remunerações aumentam sucessivamenteacima da produtividade. O momento chegará em que os custos tornar-se-ão superiores aopreço praticado no mercado, condenando a empresa a abandonar a actividade. Ora, nosector público não existe um mecanismo similar para corrigir aumentos excessivos desalários relativamente ao sector privado, que se acumulam com o passar dos anos, porefeito dos ciclos políticos e da pressão sindical.Efectivamente, em Portugal esta tendência existe. Em 2005, 13.5% da populaçãoactiva trabalhava para o Estado, um nível inferior à média na zona Euro. Mas enquanto ospaíses da zona Euro gastavam 11% do PIB com a massa salarial, Portugal gastava 14.5%.A Suécia, onde o Estado empregava 28.3% da população activa, gastava 15.8% do PIB. Oproblema não está no emprego público, mas sim nos seus salários. É natural que o saláriomédio seja mais elevado no sector público, pois emprega mais licenciados. Mas estudos doBanco de Portugal mostram que, em média, pessoas com características similares(educação, experiência, etc.) recebem mais no sector público. Este “prémio”, que era de 9%em 1996, aumentou para 16% em 2005.Para além de vencimentos mais elevados, a generalidade dos trabalhadores doEstado tem um outro benefício extraordinário relativamente ao sector privado: a segurança.Ao oferecer salários mais elevados e mais segurança, o Estado cria uma assimetria enormeno mercado de trabalho. Entre os sintomas desta assimetria estão o número de candidaturaspor cada vaga aberta no sector público, a pressão junto do poder político para os jobs forthe boys, enquanto são poucos os trabalhadores do Estado a despedirem-se para ir trabalharno sector privado.A redução dos salários no sector público deve ser vista como uma medida estruturalpara atenuar esta assimetria. Mas, dada a conjuntura de crise económica e orçamental,acaba por ser a melhor opção para cortar a despesa. Embora esta redução tenha um efeitonegativo na procura, este é certamente mais fraco do que outro tipo de cortes. O empregopúblico, o investimento público ou o subsídio de desemprego são componentes da despesamais fortes a estimular a economia e como tal é mais desaconselhado a sua redução duranteuma recessão. Mais: a teoria sugere que esta medida pode funcionar como um choque nomercado de trabalho, contribuindo para uma moderação salarial no sector privado,incentivando a criação de emprego. Política semelhante foi seguida com sucesso nos paísesnórdicos que optaram por ter um elevado número de funcionários públicos, oferecendomais segurança a troco de salários mais baixos. Este é um dos segredos para terem taxas dedesemprego tão baixas com um peso do Estado no mercado de trabalho tão elevado.Para ficarmos com uma ideia, um corte de 10% nos salários permitiria reduzir adespesa em 2 mil milhões de euros por ano, o equivalente a 1.4% do PIB. Para conseguiruma diminuição na despesa da mesma magnitude seria preciso abolir o subsídio dedesemprego ou reduzir 73 mil funcionários públicos. Mesmo todas as privatizaçõesprevistas no PEC irão gerar 1.5 mil milhões de euros por ano, durante apenas 4 anos.Que não haja dúvidas. Nenhum outro caminho permite uma redução da despesapública significativa, sem um efeito tão negativo na procura, promovendo a equidade entreo sector público e privado no mercado de trabalho, incentivando a criação de emprego, nãoatacando o estado social, garantindo o fornecimento de serviços públicos e evitandoproblemas sociais mais graves.

Pedro Maia Gomes
Professor na Universidade Carlos III, Madrid
personal.lse.ac.uk\gomesp\1-Academia\Press.htm

1 comentário:

  1. O problema, ao contrário do que se diz de boca aberta, é o PIB ser baixo, porque é que países com elevados PIBs não se andam a carpir pelos salários dos funcionários públicos? O problema não é a nossa falta de produtividade (no sentido de o povo ser lentinho como se quer fazer crer) é é a nossa falta de organização e sabermos assumir responsabilidades. Os portugueses que trabalham na Auto-Europa, na MAR-Kayak e muitas outras empresas não são diferentes dos outros portugueses, trabalham é em empresas organizadas, sem trafulhiçe. Nós temos mais trafulhas a mandar que os outros países, isso é que é!

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